Roberto Parizotti
A 5ª edição da Marcha das Margaridas coloriu Brasília mais uma
nesta quarta-feira (12). Cerca de 70 mil pessoas deixaram o estádio
Mané Garrincha logo no início da manhã e seguiram até o Congresso
Nacional.
Diante da Casa, homens e mulheres de todas as regiões do país
viraram as costas aos ataques do presidente da Câmara, Eduardo
Cunha (PMDB-RJ), às mulheres e aos movimentos sociais. Sob regência
do parlamentar, ações como a criação de uma cota de 15% para as
mulheres em todos os parlamentos do país foram rejeitadas.
Durante o trajeto, a maior manifestação popular que a capital
federal viu neste ano manteve a pluralidade. Tinha verde e amarelo,
mas também muito lilás e vermelho. Nenhuma cor era proibida. Os
manifestantes, de diversas etnias, traziam demandas do campo e das
florestas: a titulação das famílias já assentadas, o assentamento
para quem ainda não tem chão, assistência técnica para quem já
produz, mas quer crescer, e o limite da propriedade de terra para
quem vê o agronegócio avançar sem freio.
Mas a essas demandas, somaram-se a defesa da liberdade e da
democracia num país que conviver com uma onda conservadora.
Cartazes que pediam Estado laico e apontavam que o corpo é das
mulheres e não da bancada moralista pareceram se multiplicar em
relação aos últimos anos.
Liberdade para acabar com a liberdade
Em todas as intervenções sobre os carros de som, o repúdio a
qualquer tipo de golpe, dentro ou fora do parlamento, foram pontos
comuns. Ali havia muita gente que conhecia de perto o que era
perder a vida para garantir o direito à liberdade, inclusive de
defender a ditadura, como lembrou a neta de Luís Carlos Prestes,
Ana Prestes Rabelo, diante de cartazes fixados nos canteiros que
pediam intervenção militar.
“Todos que, de alguma forma, somos herdeiros de uma luta pela
democratização, que tivemos familiares muito próximos perseguidos,
presos, torturados, muitos ainda desaparecidos, e, independente
disso, todos que tem consciência do valor da democracia e da
liberdade, estão totalmente atônitos. Não imagina ter que transitar
pelas ruas de Brasília e explicar para minhas filhas de cinco e
nove anos, em pleno de 2015, o que significa a volta do regime
militar”, definiu.
Para ela, todos os partidos e movimentos preocupados com a garantia
da legalidade democrática têm a responsabilidade e o desafio de
enfrentar a mídia para desenvolver a conscientização político. “É
preciso ir para dentro das casas das pessoas, conversar, se reunir,
fazer atividades como essas porque, apesar de estarmos há 12 anos
na liderança do governo central, não conseguimos enfrentar e
avançar numa das principais batalhas que é a democratização da
mídia.”
Novo modelo
Já diante do Congresso, a secretária de Mulheres da CUT, Rosane
Silva, representou a Central que levou 15 mil mulheres à Marcha e
apontou que nenhuma transformação na igualdade entre gêneros será
possível sem enfrentar o machismo e o patriarcado.
“O primeiro passo é considerar as mulheres sujeitos políticos que
têm direito a políticas públicas que garantam creches para que
possamos deixar nossos filhos e ter maior na vida pública, que
promovam a igualdade no mundo do trabalho, onde ainda ganhamos
menos, mesmo tendo maior escolaridade”, disse.
Ao destacar que a pauta das Margaridas é também a pauta da CUT, a
dirigente lembrou que as conquistas da classe trabalhadora foram
resultado da luta nas ruas, onde a Central permanecerá em defesa da
liberdade e da democracia.
A mudança deve passar pela educação, mas para isso é preciso
enfrentar liderançs parlamentares contrárias a uma educação não
sexista e à discussão de gênero dentro da escola.
“Passamos por um período de grande enfrentamento recentemente com a
direita e com os fundamentalistas religiosos, quando tivemos a
discussão dos planos nacional, estaduais e municipais de educação,
que pautaram a retirada da educação de gênero, enquanto nós
defendemos discutir a violência cotidiana que a mulher sofre. Se
não for através da educação, dificilmente mudaremos a cultura
machista e patriarcal”, afirmou a professora Lirani, que leciona no
Paraná.
“O governo reconhece a violência contra a mulher como crime. Não é
natural, não é de família e na escola temos um espaço privilegiado
para discutir isso, mostrar a importância de tratar os amiguinhos
com igualdade, que a casa é um espaço onde tem de ter
companheirismo e as tarefas também devem ser divididas. Temos que
naturalizar o debate e não a violência”, definiu a amazonense
Isis.
Histórias na bagagem
Apesar de não ter sido divulgado até o momento pela organização do
evento, com base na marcha e na presença no Mané Garrincha, a
delegação nordestina era a maior do encontro.
Formada por mulheres como a quebradeira de coco Maria da Conceição,
de 65 anos, que deixou Igarapé Grande, no Maranhão, enfrentou três
dias de viagem e passou a noite acampada no estádio ao lado da
amiga Maria Aparecida, diretora do Sindicato dos Trabalhadores
Rurais de Igarapé Grande.
Juntas, fizeram eco na defesa da reforma agrária, porque a maioria
das quebradeiras é sem-terra, explicaram, e também da
presidenta.
“Sabemos que Dilma sozinha não tem força para mudar tudo, por isso
vamos pressionar o Congresso para mudar as coisas também. Esse
movimento sabe disso e ainda apoia ela”, falou
Aparecida.
Enquanto algumas são veteranas de luta, outras são recém-chegadas.
Edilene Alves dos Santos, de Mata Grande, em Alagoas, estado de
Margarida Alves, sindicalista assassinada em 1983 e inspiração para
todas as Margaridas, dizia estar muito nervosa quando chegou ao
Mané Garrincha.
Aos 20 anos, a estudante de educação física, enfrentou dois dias de
viagem para participar da primeira marcha. “Vim para lutar pelo
direito das mulheres. Na minha cidade tem muito preconceito”, dizia
ela, que trazia duas malas e a expectativa de ver o estádio lotado
de destemidas.
Da CUT
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