4 mil trabalhadores podem entrar em greve contra a privatização dos Portos

A possível privatização da Autoridade Portuária preocupa trabalhadores, prefeitos e governadores, que temem aumento das tarifas e desregulação do setor. Categoria não descarta greve

Por: Escrito por: Rosely Rocha | Editado por: Marize Muniz
Publicação: 19/11/2021
Imagem de 4 mil trabalhadores podem entrar em greve contra a privatização dos Portos

O governo de Jair Bolsonaro (ex-PSL) continua avançando em seu processo de entregar as empresas brasileiras ao mercado privado. Mas, a resistência às privatizações começa a crescer entre prefeitos, governadores e aliados do Executivo. Até  eles entendem que os prejuízos para o Brasil e para os brasileiros serão maiores do que qualquer ganho imediato.

Este é o caso da privatização da Companhia de Docas do Espírito Santo (Codesa) que pode abrir caminho para a privatização da Autoridade Portuária, colocando em risco emprego de 240 trabalhadores e trabalhadoras da empresa, e mais adiante os de outros 4 mil, que atuam nos 34 portos do país, incluindo os concursados da Guarda Portuária.

Se o processo de venda for adiante, os 4 mil  trabalhadores de Autoridades Portuárias de todo o país podem entrar em greve. Uma assembleia com a presença de três federações que representam os trabalhadores - Federação Nacional dos Portuários (FNP), Federação Nacional dos Estivadores (FNE) e Federação Nacional dos Conferentes e Consertadores de Carga e Descarga, Vigias Portuários, Trabalhadores de Bloco, Arrumadores e Amarradores de Navios, nas Atividades Portuárias(Fenccovib) deve ocorrer entre 7 e 8 de dezembro, para definir os rumos do movimento. Ao todo, junto com empresas privadas, são 60 mil pessoas trabalhando nos portos brasileiros.

A greve poderá ocorrer, se o governo federal insistir no processo de privatização dos portos. A esperança da categoria é o Tribunal de Contas da União (TCU), que está analisando a legalidade do processo de privatização da Codesa.

“Temos conversado com prefeitos da grande Vitória e vereadores. Não tenha dúvida de que haverá uma paralisação, se o governo insistir na venda da Codesa, o movimento poderá se espalhar por todo o país”, diz Eduardo Guterra, dirigente da FNP.

Guterra ressalta que não é somente a preservação de empregos que preocupa os trabalhadores, e sim o custo das tarifas que prejudicarão toda a sociedade brasileira.

“A privatização é ruim porque a Autoridade Portuária não concorre com outros setores empresariais. Se for constituída uma Sociedade de Proposta Especifica [SPE] como quer o governo para administrar os portos, essa empresa vai querer lucrar, pagar dividendos para os acionistas, passar a concorrer com outras empresas já instaladas e, consequentemente as tarifas portuárias vão subir. O Espirito Santo perde com a fuga de cargas e poderemos perder o controle dos portos, que é uma área de soberania nacional estratégica, e quem sempre paga é a população”, diz. 

O dirigente afirma ainda que “são as autoridades portuárias que têm o papel público de administrar junto com prefeituras, governos estaduais e federal. A atuação é integrada, tanto que grande parte dos portos da região sul do país estão em mãos dos governos estaduais e municipais”, daí a contrariedade de prefeitos, governadores e congressistas com o projeto de privatização.

"Além disso, prossegue o dirigente,  o atual modelo portuário brasileiro é semelhante ao dos maiores portos do mundo, nem os EUA abre mão do controle dos portos, até a dragagem é feita pela Marinha Americana. Aqui a proposta é entregar para iniciativa privada".

Diante da possível privatização, empresários e trabalhadores criaram o “Fórum de Vitória”, com a participação de empresas e sindicatos trabalhistas, que, inclusive, tiveram nesta quarta-feira (17), uma audiência na Comissão de Desenvolvimento da Câmara Federal, para discutir o assunto. Representantes da Federação Nacional dos Portuários, se reuniram também na tarde de ontem com o deputado federal Alexandre Padilha (SP), para discutir a privatização do Porto de São Sebastião.

“O Fórum tem sido unânime em apontar preocupação com os portos públicos. A entidade critica a resposta do governo de que não tem dinheiro para investimentos, mas não explica o que faz com o dinheiro dos impostos arrecadados”, diz Guterra.

Além dos custos mais altos na operação dos portos, a FPN teme que o tempo de concessão de 35 anos, podendo chegar a 40 anos , em caso de reequilíbrio econômico do contrato, faça uma  alteração profunda na organização de um setor vital para a economia que durará décadas. A Codesa é uma empresa auto sustentável, tanto que em 2020 deu um lucro recorde de R$ 30 milhões e tem em caixa, segundo informação do próprio Governo, R$ 100 milhões. 

Os trabalhadores denunciam ainda que o preço da Codesa, cujo valor mínimo era de R$ 719 milhões, na primeira proposta submetida à audiência pública, baixou para R$ 471 milhões.

A função da Autoridade Portuária

As Autoridades Portuárias são uma atribuição do Estado. Elas têm o papel de cuidar da segurança dos portos, junto com a Polícia Federal e Guarda Portuária; fiscalizar obras e projetos, cuidar do meio ambiente e facilitar as operações.

“É preciso controle, presença do Estado, uma coordenação. Não estamos fugindo do debate, inclusive nós dialogamos com o governo sobre a possibilidade da iniciativa privada na administração dos portos, mas o governo federal não pode abrir não como acionista majoritário”, diz Guterra.

O presidente da FNP cita como exemplo de administração possível a união dos municípios e estados em consórcios, de acordo com a lei nº 9277, da então deputada federal Telma de Souza (PT-SP), ex-prefeita e hoje vereadora de Santos, pelo partido.

“ Essa lei autoriza a criação de consórcios nos municípios e estados, autorizando a União a transferir a gestão dos portos para esses entes”, diz.

Modelos Portuários no Brasil e no Mundo

Guterra explica que existe um modelo portuário no mundo, semelhantes nos Estados Unidos, Europa e Brasil, em que a iniciativa privada opera, mas é a empresa pública (Autoridade Portuária) que faz a gestão, organizando o porto e atuando juntamente com o setor empresarial.

O governo brasileiro, no entanto, quer mudar para o modelo australiano em que a gestão é privada. Ocorre, que, segundo Guterra, que na Austrália, essa situação já está trazendo desorganização e aumento de custos.

“São as autoridades portuárias que têm esse papel público de administrar junto com prefeituras, governos estaduais e federal. A atuação é integrada, tanto que grande parte dos portos da região sul do país estão em mãos dos governos estaduais e municipais”, conta.

 



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