A música de Eduardo Dusek denuncia de forma
satírica, ácida e verdadeira o tratamento dado às empregadas e aos
empregados domésticos no Brasil. Juntam-se a esses versos frases do
tipo: "Ela é considerada da família"; "Veio do interior para morar
conosco e agora tem teto e comida"; "Ela até estuda à noite".
Essa maneira de ver as pessoas que prestam seus serviços em casas
de família, cuidando de crianças, fazendo limpeza, lavando e
passando roupas, mantendo lindos jardins, cuidando de piscinas, é
histórica. Já em 1933, Gilberto Freire, em seu livro Casa-Grande e
Senzala, avalia a formação da sociedade brasileira a partir da
organização das propriedades escravagistas. O patriarca da terra
era dono de tudo, incluídos os escravos. E essa maneira de pensar e
agir chega aos nossos tempos, expressando-se nas relações
capitalistas da sociedade brasileira, especialmente nas
estabelecidas entre patroas e empregadas domésticas. Não é
coincidência que mais de 60% da força de trabalho doméstica seja
formada por negros.
A formalização do trabalho doméstico, no Brasil, não chega a 30%.
Apenas um milhão entre os sete milhões de empregados têm emprego
formal, apontando que o modelo de trabalho doméstico é
majoritariamente informal. Nenhum outro país no mundo possui tantos
trabalhadores domésticos quanto o Brasil que, segundo dados da
Organização Internacional do Trabalho, acumula algo em torno de 13%
de todas as domésticas em um universo de 117 países. O quadro é bem
pior, pois o trabalho infantil não está incluído nesses dados.
Não desconhecemos que, ao ocorrer a "abolição da escravidão", às
negras e aos negros recém-libertos e aos seus descendentes não
restaram muitas opções de trabalho. Com isso, foram novamente
incorporados às casas-grandes, intensificando a ideologia
hierarquizada entre os seres humanos. O reflexo dessa organização
social é expresso em resquícios seculares de discriminação e
violação de direitos, principalmente de negros e pobres, e de
mulheres, que representam a maioria dos trabalhadores
domésticos.
E agora, séculos depois, uma Proposta de Emenda Constitucional
conhecida como sendo a PEC das Empregadas Domésticas causa espanto
aos empregadores que ainda consideram essas trabalhadoras e
trabalhadores como uma categoria de "quase" cidadãos. A aprovação
da PEC 66/2012 expõe a hipocrisia de uma sociedade que atua para
tornar invisíveis os excluídos historicamente. Nem a Constituição
de 1988, considerada "Constituição Cidadã", igualou os direitos dos
trabalhadores e trabalhadoras domésticas aos demais
profissionais.
Os patrões, apoiados pela maioria dos meios de comunicação, tratam
a PEC das Empregadas Domésticas como uma afronta, reforçando a
ideia de que no campo das relações trabalhistas o direito é um
entrave à livre negociação entre as partes. Desconsideram que não
há igualdade entre as partes, especialmente nesse caso, onde a
maioria das trabalhadoras e dos trabalhadores abre mão de direitos
básicos para garantir o pão de cada dia.
Não podemos cair no discurso de comparar a aprovação da PEC ao fim
da escravidão. Em verdade, nos tempos atuais, para esses
trabalhadores e trabalhadoras abrangidos, a Emenda Constitucional
tem o significado de uma primeira abolição, onde, para essas
cidadãs e cidadãos, pela primeira vez ocorre a tentativa de
equalização de direitos entre os trabalhadores. Sim, tentativa,
pois no debate sobre a regulamentação da PEC, com o seu
detalhamento na legislação, muitos pretendem articular maneiras de,
novamente, não garantir os direitos aprovados ou repassar ao
Governo os gastos, ou parte deles, decorrentes da PEC. São muitas
as propostas em torno da regulamentação da Emenda
Constitucional.
Os meios de comunicação conservadores, tentando colocar a sociedade
brasileira no olho do que seria um furacão, noticiam
incansavelmente a falácia do desemprego com o aumento de gastos
para aqueles considerados como uma segunda categoria de
trabalhadores. Os principais jornais se utilizaram de diversos
artifícios para fortalecer esse argumento. O Estado de São Paulo e
a Folha de São Paulo compararam os gastos atuais e os futuros com a
empregada contratada, demonstrando um aumento de menos de 10%. O
Globo, além do quadro comparativo, optou por apresentar hipóteses,
usando o depósito do FGTS, hora extra, indenização por demissão sem
justa causa, por exemplo, para manter a tese de que os custos com a
empregada doméstica dobrariam. A Revista Veja, em sua edição da
primeira semana de abril, disponibilizou em seu site um infográfico
para que patrões façam os cálculos dos gastos que terão com as
novas garantias de direito.
Porém, praticamente nenhum instrumento de comunicação teve a
ousadia de fazer uma matéria com o outro lado da balança, o da
trabalhadora doméstica, suas dificuldades e a forma desrespeitosa
em que ela é tratada em "nossos lares". Apenas alguns colunistas
avaliaram a PEC e expressaram o resgate da igualdade de direitos e
da cidadania dessas trabalhadoras e trabalhadores.
A verdade é que precisamos superar a cultura do trabalho doméstico
basicamente informal, com profissionais que recebem abaixo da média
salarial, que são desrespeitados e expostos a condições de trabalho
muitas vezes degradantes, com poucas garantias legais. E um dever
minimamente ético e solidário a sociedade brasileira julgar justas
as conquistas trabalhistas da PEC.
E isto parece estar acontecendo, pois apesar da tentativa de
lavagem cerebral realizada por televisões, jornais, revistas,
rádios, uma pesquisa publicada em 10 de maio de 2013, no site do
Estado de Minas, aponta que "oito em cada 10 brasileiros aprovam a
Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 66/2012 , conhecida como
PEC das Domésticas, que amplia à categoria direitos previstos em
lei para outros trabalhadores como FGTS, hora-extra e adicional
noturno. Além disso, mais de 95% da população sabe da promulgação
da PEC (pelo Senado), segundo pesquisa realizada pelo Senado
Federal com 1.222 pessoas, entre os dias 16 e 30 de abril".
Não podemos desconsiderar que os contrários à igualdade entre os
cidadãos e cidadãs brasileiros possuem a força das elites
conservadoras e manipuladoras com representação no Congresso
Nacional. Por isso, companheiras e companheiros, a luta continua. É
preciso garantir a aplicação da legislação e combater a
informalidade que atinge mais de 70% desses trabalhadores, dos
quais mais de 90% são mulheres e mais de 60% negras, é uma bandeira
fundamental dos sindicatos de trabalhadoras e trabalhadores
domésticos e de todo o movimento sindical. É preciso organizar as
forças para regulamentar e implementar efetivamente os direitos
apontados pela PEC. Tarefa que será assumida de forma firme e
organizada pela Central Única dos Trabalhadores
Jacy Afonso é Secretário Nacional de Organização da CUT
Secretário Nacional de Comunicação da CNTTL: José Carlos da Fonseca - Gibran
Redação CNTTL
Mídia Consulte Comunicação &Marketing
Editora e Assessora de Imprensa: Viviane Barbosa MTB 28121
WhatsApp: 55 + (11) 9+6948-7450
Assessoria de Tecnologia da Informação e Website: Egberto Lima
E-mail: viviane@midiaconsulte.com
Redação: jornalismo@midiaconsulte.com
Siga a CNTTL nas redes sociais:
www.facebook.com/cnttloficial
www.twitter.com/cnttloficial
www.youtube.com/cnttl
Mídia
Canal CNTTL