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“Modernizar” uma legislação “anacrônica”, privilegiando a negociação entre patrões e empregados com o objetivo de dinamizar a economia e favorecer a retomada dos empregos. Esse foi o principal argumento da cobertura sobre a reforma trabalhista nos principais veículos do país, conforme levantamento feito pela Repórter Brasil.
O Jornal da Record foi o menos crítico à
proposta apresentada pelo governo, com 100% das reportagens
favoráveis. O Globo foi o segundo mais alinhado,
com 88% do conteúdo suportando o que defende o Palácio do Planalto.
Em seguida, aparecem o Jornal Nacional (77%)
e O Estado de S.Paulo (68%). A Folha de
S.Paulo (42%) destoou dos outros veículos, já que
criticou a proposta em mais de metade dos seus textos.
Para chegar a essa conclusão, a Repórter
Brasil analisou mais de 150 textos dos três jornais de
maior projeção nacional – Folha, O
Globo e Estadão – e 30 minutos de
matérias dos dois principais telejornais – Jornal
Nacional e Jornal da Record. Foram
avaliados os cinco dias anteriores e os cinco posteriores à
aprovação do relatório do deputado Rogério Marinho (PSDB-RN) na
comissão especial da Câmara: de 20 a 30 de abril de 2017.
Conteúdos em que prevaleciam o detalhamento da proposta, sem a
apresentação de contrapontos, ou quando o apoio era explícito foram
avaliados como favoráveis e alinhados ao governo. Esse é o critério
utilizado pelas maiores empresas do Brasil especializadas em
análise de imagem e reputação.
Entre os veículos analisados, o Jornal da
Record foi o que reverberou mais explicitamente a ideia
de que as mudanças pretendidas pela gestão do presidente Michel
Temer abrirão novas vagas no mercado. Reforçou essa tese usando
depoimentos de estudiosos e de brasileiros anônimos demonstrando
“esperança”.
Os impressos, em especial o Estadão, deram a
entender que se trata de uma briga entre governo e sindicatos, que
podem perder a principal fonte de financiamento caso o fim do
imposto sindical seja aprovado. Entre as grandes entidades, apenas
a Central Única dos Trabalhadores (CUT) não depende da contribuição
obrigatória para se manter.
Matérias focadas na greve geral de 28 de abril, que apenas
mencionavam a reforma trabalhista como uma das insatisfações dos
manifestantes, não foram consideradas na contabilização dos números
para não distorcerem os resultados. Essas reportagens foram
consideradas somente na análise qualitativa.
Na cobertura específica dos protestos, todos os veículos expuseram
em primeiro plano ações de vandalismo, confrontos com a polícia e
os prejuízos causados à população em decorrência da paralisação dos
transportes.
Como escreveu a ombudsman da Folha, Paula
Cesarino Costa, todos, sem exceção, olharam para o impacto sobre a
árvore, deixando de olhar para a situação da floresta. Sem
críticas, as razões por trás daqueles atos.
Esta é a segunda pesquisa da Repórter
Brasil sobre a cobertura que a imprensa tem feito sobre
as reformas do governo Temer. Leia também o levantamento sobre
a Reforma da Previdência.
Veja, abaixo, detalhes do estudo feito por Repórter
Brasil.
Jornal Nacional: todas as fontes foram favoráveis à
reforma:
Todos os entrevistados pelo Jornal Nacional no período analisado
defenderam a necessidade de “modernizar” uma legislação que
consideram “anacrônica”. Três das quatro reportagens são claramente
alinhadas à proposta do governo. Apenas uma, de 2min31s, pode ser
considerada desfavorável ao projeto de lei já aprovado pela Câmara
dos Deputados. Ela mostrava que, na opinião de “centrais
sindicais”, as mudanças previstas “fragilizam direitos” dos
empregados.
A reportagem mais crítica foi ao ar na noite de 28 de abril, em
meio a uma extensa cobertura que privilegiou “vandalismo”,
“confrontos” entre manifestantes e policiais, além dos prejuízos à
população durante a greve geral em diversas cidades do País. No
vídeo, o âncora William Bonner elenca os principais pontos tanto da reforma
trabalhista quanto da Previdência, apresentando também os
argumentos do Palácio do Planalto, mas não abre espaço para as
fontes falarem diretamente aos telespectadores.
Nas três reportagens favoráveis ao projeto de lei,
o JN deixa claro que houve tensão e discussões
exaltadas na sessão da comissão especial da reforma trabalhista e
durante a votação no plenário da Câmara, mas não explora as razões
das divergências entre os parlamentares e só ouve fontes que apoiam
a proposta.
Sempre com o viés de que é preciso modernizar a CLT, avançar nas
relações de trabalho e que as alterações previstas não mexerão em
direitos assegurados pela Constituição, como jornada semanal de 44
horas e 13º salário.
O deputado Rogério Marinho (PSDB-RN), relator da reforma, teve
espaço para justificar essa visão. “Nós temos uma lei de 1943. Às
vezes, a gente é chamado de conservador aqui neste Parlamento.
Conservador é quem não quer mudar. Então, tem gente que está
apegado a uma lei de 70 anos. Uma lei anacrônica, antiga, uma lei
que não tem mais nada a ver com o espírito do tempo”.
Já Cláudio Sampaio, especialista em direito trabalhista, reforça
essa percepção ao destacar que “na prática”, a nova lei “vai
estimular a criação de empregos formais e não vai tirar
direitos”.
Jornal da Record: Desemprego cairá após a
reforma
Nenhuma matéria desfavorável à reforma trabalhista e também nenhuma
fonte crítica ao projeto de lei apresentado pela gestão de Michel
Temer. Assim foram os 19m26s da cobertura do Jornal da
Record voltado ao tema. O programa também se dedicou mais
que o seu concorrente às mudanças na CLT. Foi um tempo 74,5% maior
que o Jornal Nacional em oito reportagens
veiculadas.
Além de reiterar a necessidade de “modernização” de uma lei que considerada
antiga e desatualizada, a Record buscou reverberar que as
alterações serão benéficas porque valorizam a negociação entre
patrões e funcionários, trarão mais empregos e ajudarão na retomada
da economia.
E que pontos garantidos pela Constituição, como FGTS e
seguro-desemprego, não serão mexidos. Para isso, se apoiou em
entrevistas com deputados da base do governo, representantes do
setor empresarial, professores de direito e também brasileiros
anônimos, que dizem acreditar que mais vagas serão abertas. Um
deles relata que acertar itens como férias e horários, por exemplo,
será “mais tranquilo”.
A emissora incrementa o noticiário com números do desemprego,
chegando a ressaltar que “a esperança” para baixar a taxa recorde
de 14,2 milhões de pessoas desocupadas no Brasil é a reforma e que
várias sugestões incorporadas ao projeto de lei foram dadas pelos
próprios trabalhadores. Dá a entender que a proposta é positiva
para ambos os lados e que não haverá perdas.
Sustentado na ideia de que a CLT “trava o crescimento do
Brasil”, o Jornal da Record evidencia que as
discussões na Câmara dos Deputados foram tensas e que houve embate
entre situação e oposição. Mas, assim como a TV Globo, não
apresenta o posicionamento de parlamentares contrários às
alterações na legislação.
Outras fontes mostram posições ainda mais contundentes. José
Eduardo Pastore, advogado trabalhista, avalia que o objetivo é
criar empregos e trazer para a formalidade os milhões de
brasileiros que estão atualmente na informalidade.
A reportagem não informa, contudo, que o jurista também é consultor
da Confederação Nacional da Indústria (CNI). Já o deputado José
Carlos Aleluia (DEM-BA), da base do governo, alega que a “tutela
excessiva” prevista na CLT significa cerceamento de liberdade nas
relações de trabalho.
O Globo: Jornal mais alinhado com a proposta do
governo
Apesar de estar atrás da Folha e
do Estadão em quantidade de textos publicados
sobre a reforma, 43 no período de 20 a 30 de abril, O
Globo é o impresso mais alinhado ao projeto do governo –
com 88% da abordagem favorável às mudanças propostas na CLT. Também
se destaca por trazer um número maior de fontes: mais de 60%
superior aos concorrentes.
Entre os entrevistados pelo jornal carioca, 75% apoiam as
alterações. Enquanto na Folha e
no Estadão esse índice é de 44% e 42%,
respectivamente. O fio condutor de O Globo, porém, se
assemelha aos demais: a necessidade de reduzir os custos do emprego
para ajudar na estabilidade econômica e o País poder voltar a
crescer.
O jornalista Carlos Alberto Sardenberg deixa isso explícito ao
escrever que, “sem a modernização das relações trabalhistas, o
Brasil continuará sendo um dos países mais caros do mundo para se
investir e ganhar dinheiro honestamente. Logo, não haverá retomada
consistente”. Merval Pereira faz coro, responsabilizando os
governos petistas pela recessão. “O mercado de trabalho hoje, muito
influenciado pela globalização, já não comporta a visão getulista
de um país isolado”, diz.
O Globo publicou duas reportagens de capa sobre a
reforma. Uma em 26 de abril, relatando a passagem do projeto pela
comissão especial, e outra no dia seguinte, valorizando a aprovação
no plenário da Câmara. Embora tenha descrito que a sessão de
votação foi tensa por conta de divergências entre os parlamentares,
apresenta apenas uma voz dissonante em meio a outras quatro
defendendo as alterações na CLT.
O deputado federal Júlio Delgado (PSB-MG) critica a fragilidade do
governo Temer ao observar que o presidente obrigou ministros a
deixarem temporariamente seus cargos para retomar o mandato e
engrossar o apoio à proposta.
Em contraponto, o deputado Ricardo Tripoli (PSDB-SP) apelou para a
“responsabilidade”. “Esse discurso dos anti-imperialistas está
superado. Sem capital, não se gera emprego”, declarou. A percepção
que o impresso transmite é de que os grupos contrários à
flexibilização da lei defendem, na verdade, “a manutenção de
vantagens de sindicatos”, conforme descreve no editorial de 29 de
abril, um dia depois da greve geral.
O Estado de S.Paulo: Críticas aos sindicatos alimentam
cobertura
Com 68% dos textos publicados favoráveis à reforma trabalhista,
incluindo duas capas, o Estadão fica em 4º lugar
em alinhamento com a proposta do governo. Perde
para Jornal da Record (100%), O
Globo (88%) e Jornal Nacional (77%).
Só está à frente da Folha (42%).
O que levou o veículo à penúltima colocação, contudo, não foi uma
abordagem crítica ao projeto de Temer, mas uma cobertura que
privilegiou as divergências entre os partidos, especialmente a
“rebeldia” do PSB, e as expectativas quanto à repercussão da greve
geral nas votações do Congresso. Ao longo dos 11 dias analisados,
o Estadão reverberou que a legislação
precisa ser modernizada para que o Brasil volte a crescer e
gerar empregos, com colunistas e articulistas afinados.
“Goste ou não o PT, a reforma trabalhista é vital para recuperar a
economia e os empregos”, escreve o ex-ministro e ex-presidente do
Tribunal Superior do Trabalho Almir Pazzianotto Pinto. “Manter o
engessamento das relações de trabalho com leis e regulamentações
dos anos 40 é condenar o País à asfixia”, argumenta o jornalista
Celso Ming.
Já Hélio Zylberstajn, professor da Faculdade de Economia,
Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo,
questiona a “gritaria” de quem se opõe às mudanças. Em análise
publicada em 27 de abril, logo depois da aprovação em plenário, ele
afirma que leu e releu tanto o projeto de lei quanto a emenda
elaborada pela comissão especial da Câmara e não encontrou nenhum
artigo que elimina direitos dos trabalhadores.
Em boa parte da cobertura sobre o assunto nesta mesma edição,
o Estadão abordou o impacto do PL sobre os
sindicatos, reforçando o viés de que a paralisação programada para
o dia seguinte teria como pano de fundo a luta dessas instituições
para que o imposto sindical continuasse obrigatório. Ricardo Patah,
presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT) e do Sindicato
dos Comerciários de São Paulo, sustenta que o fim da contribuição é
para “sufocar o movimento”.
Uma semana antes, a publicação havia trazido reportagem com
declaração do presidente da Câmara, Rodrigo Maia, destacada no
título: “Sindicatos não querem perder a boquinha”. Das fontes
entrevistadas pelo jornal, 57% questionaram a reforma. Mas as
críticas ficaram concentradas em uma pequena parte dos 17 textos
negativos, ante 36 positivos veiculados no período.
Folha de S.Paulo: Colunistas e expectativas de greve levam
à baixa adesão
Se o Jornal da Record se mostrou 100% alinhado à
proposta do governo, a Folha foi a mais crítica:
apenas 42% da cobertura pró-reforma trabalhista. Colunistas como
Vladimir Safatle, Janio de Freitas e André Singer, assim como
reportagens centradas nas expectativas quanto ao impacto da greve
geral e nas divergências entre os partidos sobre a repercussão do
PL para os trabalhadores, ajudaram a segurar o veículo na 5ª
colocação.
A economista Laura Carvalho, por exemplo, que escreve às
quintas-feiras, publicou na véspera da paralisação que a
proliferação de estudos indicando que a desregulamentação do
mercado não eleva, ou até prejudica, o nível de emprego parece
ter levado alguns organismos multilaterais que pregavam maior
flexibilidade a mudarem de posição.
No mesmo dia, porém, a manchete da Folha expunha
a aprovação da reforma na Câmara. Apesar de ter registrado os
protestos da oposição, a edição se dedicou principalmente a
detalhar o esforço do governo para atrair mais apoio para a agenda
econômica, o que tornou a abordagem favorável para o Planalto.
O jornal veiculou outras duas capas sobre a reforma. Uma delas, em
20 de abril e a única considerada negativa por Repórter
Brasil, relatava a “manobra” da Câmara para reverter a decisão
da véspera que havia rejeitado o requerimento para acelerar a
tramitação do PL. “Método Eduardo Cunha” foi uma das expressões
usadas pela publicação.
O espaço aberto pela Folha, 55 textos no período
analisado, também foi maior do que o dos outros jornais. Já a
proporção de entrevistados que apoiaram a reforma, 44%, foi próxima
aos 43% do Estadão e bem menor do que os 75%
de O Globo. O sociólogo Clemente Ganz Lúcio, diretor
técnico do Dieese, chama atenção para “a lógica por trás” da
reforma: “reduzir estruturalmente o custo do trabalho, impedir a
proteção da legislação e dos sindicatos. É uma regressão, porque,
quando você precariza as relações de trabalho, você aumenta o
conflito”.
Advogados ressaltaram ainda que sindicatos fracos negociando fragiliza o trabalhador. Em sua coluna, publicada dois dias depois da greve geral, a ombudsman Paula Cesarino Costa cobra uma cobertura mais analítica e profunda. Avalia que, assim como os outros jornais, a Folha não deixou claro que está em jogo a perda de direitos em nome do ajuste fiscal.
Secretário Nacional de Comunicação da CNTTL: José Carlos da Fonseca - Gibran
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