New York Times: “O fim do mundo já chegou ao Brasil”

Jornal americano diz que Temer quer impor sacrifícios a um povo que vive num dos mais desiguais países do mundo

Por: New York Times
Publicação: 09/01/2017
Imagem de New York Times: “O fim do mundo já chegou ao Brasil”

divulgação

Confira a seguir no Portal CNTTL o artigo da jornalista brasileira correspondente do New York Times, Vanessa Bárbara.

Ao menos isso é o que as pessoas estão falando. Uma emenda constitucional que foi aprovada no Senado mês passado está sendo chamada de "PEC do Fim do Mundo" pelos seus oponentes. Por quê? Porque as consequências da emenda parecem desastrosas - e duradouras. Irá impôr um congelamento de 20 anos em todos os gastos federais, incluindo educação e saúde.

O governo justificou a medida com base no fato que o Brasil enfrenta queda de orçamento severa. Mas o povo não está comprando a ideia. Uma pesquisa mês passado descobriu que apenas 241% da população apóia a emenda. Brasileiros tomaram as ruas para expressar sua desaprovação. Eles foram, como sempre, recebidos com gás lacrimogêneo e cavalaria policial. Estudantes secundaristas ocuparam mais de 1.000 escolas em protesto, muitas no estado sulista do Paraná.

O governo não está recuando. A "PEC do Fim do Mundo" é só mais uma das muitas medidas neoliberais sendo levadas à cabo por Michel Temer, o presidente. Deveria ser motivo de preocupação que o Sr. Temer possa empreender tantas reformas, considerando especialmente que a maior parte delas, incluindo o congelamento de gastos, vai contra a agenda daquela pessoa que - diferente do Sr. Temer - realmente ganhou as eleições presidenciais.

Último agosto, A Presidenta Dilma Rousseff, do Partido dos Trabalhadores, foi removida do cargo com as alegações que ela manipulou o orçamento público. Assim que o Sr. Temer, que havia sido o vice-presidente de Rousseff, assumiu a posição, anunciou uma série de políticas neoliberais. Ele ainda o faz, falando que está tendo vantagem de sua impopularidade para implementar medidas impopulares no lugar.

Alguns dos planos econômicos do Sr. Temer nem mesmo são conectados ao déficit orçamentário. Ainda mês passado, logo após o congelamento de gastos ser aprovado, o governo propôs uma lei trabalhista que permite negociações entre empregadores e sindicatos que prevaleçam às leis trabalhistas. A nova proposta também aumenta o número máximo de tempo de trabalho para 12 horas por dia, e reduz regulamentos entre empresários e funcionários temporários. A comunidade empresarial simpatizou com o plano.

A emenda orçamentária, como muitas das medidas de Temer, irá afetar os cidadãos mais pobres e mais vulneráveis durante décadas. Esta não é somente a visão dos oponentes de esquerda do presidente. Philip Alston, o relator especial das Nações Unidas em direitos humanos e extrema pobreza, disse recentemente que esta medida irá "bloquear as despesas de forma inadequada e rápida levando a diminuição dos cuidados de saúde, da educação e da previdência social, colocando toda uma geração em risco de ter os padrões de proteção social serem muito inferiores aos atualmente existentes."

Sr. Alston adicionou que a lei poderá colocar o Brasil em uma "categoria socialmente retrógrada própria." O que parece exatamente o que o Sr. Temer e seus aliados desejam que seja.

Em soma ao congelamento de gastos, Sr. Temer apresentou uma proposta de renovação do sistema de pensões e aposentadorias do país. Sua proposta coloca a aposentadoria à idade de 65 anos, em um país onde a média das pessoas se aposenta aos 54 anos. A lei também irá exigir ao menos 25 anos de contribuição para o sistema de previdência social tanto para homens quanto para mulheres.

Há boas razões para leis como essa não terem sido aprovadas antes no Brasil. Apesar da expectativa média de vida ser de 74 anos no Brasil, nós somos um dos países mais desiguais no mundo. Por exemplo, em 37% das cidades da periferia de São Paulo, pessoas têm uma expectativa de vida de menos de 65 anos. E é muito menor para os pobres no campo.

Alguns dos planos econômicos do Sr. Temer nem mesmo são conectados ao déficit orçamentário. Ainda mês passado, logo após o congelamento de gastos ser aprovado, o governo propôs uma lei trabalhista que permite negociações entre empregadores e sindicatos que prevaleçam às leis trabalhistas. A nova proposta também aumenta o número máximo de tempo de trabalho para 12 horas por dia, e reduz regulamentos entre empresários e funcionários temporários. A comunidade empresarial simpatizou com o plano. Sindicatos trabalhistas estão enfurecidos.

Outra prioridade da presidência de Temer é o que é conhecido como a lei da terceirização. Foi primeiramente proposta em 2004, mas nunca passou devido a forte resistência dos sindicatos trabalhistas. Em abril de 2015, foi ratificada pela Câmara dos Deputados e agora aguarda as considerações do Senado. A lei liberaria empresas de contratar qualquer trabalho terceirizado, mesmo do seu núcleo profissional. Sob as leis atuais, empresas somente podem terceirizar não somente os trabalhos "não-essenciais", como posições de limpeza e segurança, enquanto trabalhadores "essenciais" devem ser contratados diretos da companhia, o que significa que estão obrigados à todos os direitos e benefícios prescritos na lei, assim como férias remuneradas, licença-maternidade e bônus de final de ano.

Dado isso, não deve ser surpresa que a administração de Temer é altamente impopular: uma pesquisa em dezembro descobriu que 51% dos brasileiros a classificaram como "ruim" ou "terrível." (Apenas 10% dos pesquisados disseram aprovar este governo. 34% o chamam de "regular".) Sr. Temer, que tomou o poder graças ao impeachment de Dilma Rousseff, também foi culpado de ultrapassar os limites financeiros de campanha e foi citado em um dos diversos escândalos de corrupção que desenrolam no pais.

De qualquer forma, o novo governo já recebeu apoio das seguintes organizações: Federação brasileira dos bancos, a Frente parlamentar de agricultura, Confederação Nacional da Indústria, Organização do Comércio Exterior, a federação de indústrias do estado de São Paulo, Federação de Indústrias do estado do Rio de Janeiro, Câmara brasileira de Construção Industrial, Federação Nacional dos Distribuidores de Veículos e diversos executivos de elite.

Para alguns brasileiros, ao menos, o final do mundo está sendo uma oportunidade de ouro.



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