Karina Zambrana
Cerca de cinco mil pessoas
participaram na quarta-feira (6), em Brasília, da "Marcha da Saúde,
da Seguridade e da Democracia". A mobilização teve como principal
objetivo protestar contra a Proposta de Emenda à Constituição (PEC)
241, encaminhada ao Congresso pelo presidente provisório Michel
Temer, que fixa um teto para os gastos públicos.
A PEC limita os gastos públicos em até 20 anos e, conforme contas
de especialistas, pode vir a representar perto de R$ 2,7 bilhões a
menos para o SUS, até 2018. Ontem, manifestantes de diversas
entidades participaram de audiências públicas no Congresso, onde
debateram o tema com os parlamentares e apresentaram seus
argumentos ao ministro da Saúde, Ricardo Barros. O evento resultou
na retirada de vários profissionais do setor do local próximo a
onde se encontrava o ministro, por parte da segurança
legislativa.
Barros, no entanto, disse que as manifestações são legítimas. O
ministro só contestou os gritos de “golpista” dos manifestantes,
com os quais disse que não concorda, mas afirmou que está do mesmo
lado que eles. “Saibam que concordamos com as mesmas teses e não há
motivo de discórdia, porque tudo o que queremos é a melhor saúde
para os brasileiros e o SUS forte”, afirmou.
Também foi retomada, ontem, a chamada Frente Parlamentar Mista pelo
fortalecimento do SUS. A intenção é dar início a uma série de
mobilizações, com o apoio dos deputados e senadores, para
conscientizar a população sobre os pontos da PEC considerados como
negativos.
Evitar retrocessos
Para o presidente do Conselho Nacional de Saúde (CNS), Ronald
Ferreira dos Santos, o movimento “é uma forma de evitar retrocessos
das conquistas garantidas pela Constituição de 1988, que implantou
o SUS”. “É chegada a hora de lutarmos pelos direitos obtidos com a
promulgação de nossa Carta Magna, há quase 30 anos. Não queremos
nenhum direito a menos”, disse.
Segundo material distribuído pelos participantes da Marcha, o
Brasil passa por um momento histórico, “onde a defesa da democracia
e dos direitos do povo brasileiro estão na agenda dos movimentos
sociais e de todos os cidadãos, motivo pelo qual sentem a
necessidade de retomar as mobilizações”.
Esta é a segunda edição da Marcha em Defesa do SUS (a última foi no
ano passado). Tem como intuito, também, a defesa da seguridade
social, “a partir da convicção de que a defesa do SUS passa pela
defesa dos direitos sociais, incluindo a Previdência e a
Assistência Social”, conforme destaca o documento distribuído no
local – e assinado por várias entidades.
Os participantes protestam, ainda, contra a extinção do Ministério
do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), assim como contra
qualquer forma de flexibilização a ser feita na Consolidação das
Leis do Trabalho (CLT) e o fatiamento do Ministério da Previdência
– que passou a ter suas atribuições no governo Temer divididas
entre os ministérios da Fazenda e do Desenvolvimento Social (MDS) e
Agrário (MDA).
Limite
De acordo com a PEC 241, a regra do reajuste de gastos pela
inflação, sem crescimento real das despesas, deverá vigorar por 20
anos. O governo poderá propor, por meio de projeto de lei, a
revisão desse critério, para entrar em vigor a partir do décimo ano
de vigência da emenda. Conforme a explicação do Executivo, quando
encaminhou a matéria ao Congresso, a medida, chamada de “Novo
Regime Fiscal”, deverá conter o crescimento das despesas
federais.
O líder da minoria no Senado, senador Lindbergh Farias (PT-RJ),
contestou essa explicação com a apresentação de uma estimativa
feita pela equipe do seu gabinete sobre o que seria observado no
país se a PEC do teto dos gastos tivesse sido aprovada em 2006.
Segundo ele, o orçamento da Saúde, que foi de R$ 102 bilhões dez
anos atrás, estaria hoje em R$ 65 bilhões. O orçamento da Educação,
por sua vez, que foi de R$ 103 bilhões, seria de R$ 31 bilhões. E o
salário mínimo, que atualmente é de R$ 880, seria R$ 550.
O senador Paulo Paim (PT-RS) afirmou que problemas observados no
SUS atualmente precisam ser resolvidos com uma melhor gestão, e não
por meio da redução de recursos para a população carente, que não
tem acesso aos planos privados de saúde. “Não vamos permitir, neste
Congresso, que sejam retirados direitos conquistados a dura penas”,
reclamou o senador.
Já a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) e o deputado Alessandro
Molon (Rede-RJ) disseram que não é possível ser aprovada uma
proposta que prevê limites para gastos tidos como essenciais para
os brasileiros, pensando nos governos dos próximos cinco
presidentes que o Brasil virá a ter.
O senador e ex-ministro Humberto Costa (PT-PE) afirmou que caso a
PEC 241 seja aprovada, o investimento a ser retirado do SUS nos
próximos dois anos, que está ameaçado, "é equivalente ao montante
que permitiria a manutenção de todos os hospitais do país
(federais, estaduais, municipais e Santas Casas) durante três
meses”.
“A PEC de Temer vai fazer o desmonte do SUS, que é um patrimônio
público. Se ela estivesse em vigor nos últimos dez anos, teríamos
perdido 32% de recursos para a área da Saúde, sem contar com uma
redução de 70% na área da Educação”, acrescentou o senador, que é
líder do PT no Senado. Costa disse que o SUS hoje é um dos
programas mais completos do mundo em atendimento à população e seu
sucateamento pode custar muito para o povo carente brasileiro.
“A rede pública de Saúde atua desde os serviços em hospitais
passando pelas campanhas de vacinação, programas como Saúde da
Família, Samu, Farmácia Popular e Brasil Sorridente. O atual
ministro disse que o intuito de fortalecer o sistema privado de
saúde, fragilizando cada vez mais o serviço público e colocando em
risco o atendimento universal que caracteriza o SUS”,
ressaltou.
O líder petista disse que já existe forte articulação política para
evitar que a PEC passe no Congresso, o que foi confirmado, também,
pelo senador Lindbergh Farias. “Vamos atuar de forma integrada para
tentar evitar este retrocesso para o país”,
disse.
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