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O eventual governo do vice-presidente Michel Temer, que pode ser instituído com a aceitação do processo de impeachment de Dilma Rousseff pelo Senado, não terá fôlego para recuperar a economia, defende o economista Amir Khair, que já foi secretário municipal de Finanças de São Paulo. "Eu acho que vai ser um desastre completo. É até bom a Dilma sair para deixar a bomba estourar na mão dele, porque ele vem com essa onda de reduzir despesa na área social. Vão pegar uma população já bastante sacrificada, e provavelmente vai ter um período de trégua, vamos chamar assim, os empresários e os bancos vão puxar o saco do novo governo, mas como é um governo que é manchado moralmente, porque tem o Eduardo Cunha (PMDB-RJ) comandando o processo (de impeachment), é um governo que tem perna curta do ponto de vista moral", sustenta.
"Em segundo lugar, há que se destacar o seguinte: todo mundo fala em despesa pública do governo federal, mas o governo federal é responsável por apenas 36% da despesa pública, não financeira, tirando os juros, e 34% pertencem a estados e municípios", acrescenta Khair, destacando a participação de estados e municípios na crise fiscal.
Uma outra frente de mudança, defendida por Dilma e que deve ser levada adiante por Temer, também será fonte de descontentamento, só que da classe média, ampliando a insatisfação com o governo. "Vão ficar discutindo a Previdência Social, que é um abacaxi político para o governo, porque vai mexer com a classe média", diz o economista. Ele lembra ainda outra fonte de descontentamento e não vê como a população apoiar Temer. "Vão continuar querendo desvincular (da Constituição) os recursos para educação e saúde, e tudo isso vai dar um problema grave para todo mundo", diz.
"Não vejo boa chance para a renda e o emprego no governo Temer, como também não estou vendo no governo Dilma. Sou um crítico do governo Dilma, acho que ela ganhou a eleição com um projeto e foi querer puxar o saco da elite. Em vez de ela fazer um programa mais firme em relação ao dinheiro para a área social, mas só que com responsabilidade fiscal, ela pegou o Joaquim Levy para comandar a área econômica, que é um diretor de banco." Khair afirma que "não se faz isso, você não chama a raposa para tomar conta do galinheiro". Para ele, "botar no Ministério da Fazenda alguém ligado ao mercado financeiro é sancionar que os juros vão se manter altos. Não precisa ser expert para saber disso".
Atacar o problema dos juros
Os resultados das contas primárias do país, que estão no centro das atenções do mercado financeiro ao pressionar o governo pelo ajuste fiscal, representam uma discussão ideológica que esconde a conta de juros da população e, mais do que isso, escondem os resultados nominais que efetivamente contam o desempenho do governo. Por definição, as contas primárias são todo o balanço de receitas e despesas, sem o pagamento de juros.
"O problema do governo – e não quero dizer com isso que você esteja sujeito a perder o mandato, o que é a questão política – mas o que eu falo do ponto de vista técnico é que este governo Dilma errou gravemente na questão fiscal. E não é o único no Brasil a errar. O Fernando Henrique errou gravemente na questão fiscal, no primeiro mandato dele, mas a questão fiscal não é entendida aqui como um problema de responsabilidade, porque não se discute a questão fiscal no Brasil", defende o economista.
"O que se discute é como se a questão fiscal fosse apenas os valores que não envolvem juros. O Brasil teve déficit fiscal no ano passado, de mais de R$ 600 bilhões, atingiu 10,3% do PIB, isso do ponto de vista nominal, e os juros foram 8,5% do PIB", afirma Khair. "Os juros representaram 82% do déficit. Só que ninguém fala que isso é déficit. E é déficit em qualquer lugar do mundo. Só aqui no Brasil que o pessoal fala desse déficit ou superávit primário."
Ele diz que o governo Dilma, em 2011, 2012, e 2013, "teve um desempenho fiscal muito bom no resultado nominal, porque a conta de juros não foi alta". Nesse período, a taxa Selic esteve abaixo de 8%, reduzindo a remuneração de títulos do Tesouro. "Mas quando chegou em 2014 ela já pulou para cima na conta de juros, já foi para 6,3% (do PIB) e começou a subir muito. Em 2015, foi para 8,4% e este ano creio que deve bater em 9%", acredita.
O economista lembra que o déficit nas contas do governo federal existe há muito anos. "O orçamento é deficitário historicamente. Só que aqui no Brasil há uma hipocrisia na discussão sobre a questão fiscal. Não consideram os juros como sendo uma despesa fiscal. E o juro na contabilidade pública integra uma categoria de despesa chamada despesas correntes, que é a mesma que integra a despesa de pessoal, é a mesma categoria de despesa da contabilidade pública."
Para Khair, a chance de o país sair do buraco sem atacar o problema de juros é pequena. "Para isso tem de vender reservas – e as reservas custam os olhos da cara – não tem a mínima justificativa para manter esse excesso de reservas, mas esse governo pode dar na veneta de querer fazer coisas boas para agradar a população, pode dar a loucura de vender reservas, mas nada leva a crer que vá se fazer isso, porque todo o suporte desse plano deles não toca na questão central das finanças públicas, nem na questão do próprio crescimento econômico", diz. Ele chega a brincar que o programa econômico de Temer, chamado Uma Ponte para o Futuro, deveria se chamar Uma Ponte para o Passado.
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