Impeachment: quem vai “pagar o pato” é o trabalhador

Confira no Portal CNTTL o artigo de Marcos Verlaine, jornalista, analista político e assessor parlamentar do Diap

Por: Do Vermelho
Publicação: 22/03/2016
Imagem de Impeachment: quem vai “pagar o pato” é o trabalhador

divulgação

Em artigo, o analista político destaca que se Dilma cair, o Brasil entrará em uma espiral de crise política, econômica e social ainda mais grave e quem mais perderá será o trabalhador. Leia a seguir no Portal CNTTL: 

É tanto que não se viu em nenhuma das manifestações de domingo cartazes contra o desemprego, a alta dos juros, a carestia e o arrocho salarial. Isto demonstra, em primeiro lugar, que esses atos não representam os trabalhadores. E, em segundo, que se forem vitoriosos haverá grande retrocesso nos direitos trabalhistas e sociais. Não é à toa que não se enxerga a cara do povo nesses atos.

Uma massa de gente foi às ruas no último domingo (13) em todas as capitais brasileiras e em centenas de cidades Brasil afora. Se foi maior ou menor que a última manifestação de 2015 isto é absolutamente desimportante. Os fatos são: o governo está nas cordas e o PT está acossado e desarvorado. Negar isto é não querer entender o que está acontecendo.

Diante dessa avalanche conservadora em curso, uma coisa é certa: se Dilma cair por um ‘golpe de mão’, no caso o impeachment, ou cassada pelo TSE, o Brasil entrará em uma espiral de crise política, econômica e social ainda mais grave e quem mais perderá será o trabalhador.

As manifestações convocadas e organizadas pela mídia e financiadas pelos empresários, o ‘pato’ da Fiesp era a senha que faltava, e a concentração dos manifestantes na avenida Paulista em frente à sede do empresariado paulista, não deixam dúvidas quanto a isto. A cada lance vai ficando mais claro os interesses inconfessos dos endinheirados por trás da obsessão contra a corrupção.

Os manifestantes, em sua grande maioria, estavam nas ruas e têm ido aos atos sob o prisma de combate à corrupção. Essa bandeira sempre mobilizou e ‘escandalizou’ os estratos médios brasileiros. Este, inclusive, foi o mote contra Getúlio Vargas em 1954 e também foi um dos combustíveis que alimentou o golpe civil-militar de 1964.

Agora não é diferente. As manifestações até então realizadas contra o governo, Lula, Dilma, o PT, e qualquer resquício de esquerda tem essa dimensão de cunho moralista. Não que não esteja correta a luta contra a corrupção. Mas essa bandeira se transformou num ‘Cavalo de Tróia’. O embate político em curso, tendo o combate à corrupção como pano de fundo, tem servido para encobrir uma agenda escandalosamente conservadora, do ponto de vista político, e neoliberal do ponto de vista econômico.

É tanto que não se viu em nenhuma das manifestações de domingo cartazes contra o desemprego, a alta dos juros, a carestia e o arrocho salarial. Isto demonstra, em primeiro lugar, que esses atos não representam os trabalhadores. E, em segundo, que se forem vitoriosos haverá grande retrocesso nos direitos trabalhistas e sociais. Não é à toa que não se enxerga a cara do povo nesses atos.

O setor político e socialmente organizado que mais perderá será o movimento sindical e, por consequência, os assalariados, do setor privado e público. O roteiro está definido e pode ser mais bem compreendido por meio da leitura do artigo ‘Ataques ao movimento sindical à vista’, do diretor de Documentação do Diap, Antônio Queiroz, publicado no dia 7 de março, no portal do órgão.

Será um processo de desqualificação e criminalização do movimento sindical. No artigo, Queiroz aponta o roteiro: ‘Para atingir esse objetivo vão utilizar a grande imprensa, o Ministério Público e o Congresso. A imprensa será a responsável por publicar denúncias envolvendo entidades e lideranças sindicais. O Ministério Público será acionado para fiscalizar e auditar as entidades, especialmente em relação ao uso dos recursos oriundos da contribuição sindical compulsória. E o Congresso para instalar comissões parlamentares de inquéritos para expor negativamente ou criminalizar a atividade sindical.’

O Congresso também será palco, como tem sido sob o atual presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), de inúmeras propostas para flexibilizar ou retirar direitos dos trabalhadores, sob o comando da forte e numerosa bancada empresarial.

Qualquer saída agora para debelar a crise econômica terá alto custo para os trabalhadores, haja vista que os empresários travam a economia por não acreditarem na capacidade de o governo construir soluções razoáveis para o País.

Ameaças a direitos no Congresso

Matéria prima não falta no Congresso Nacional que ameace direitos dos trabalhadores. Tanto na Câmara, quanto no Senado.

Em levantamento, cujo número é simbólico, pois há outras tantas proposições com o mesmo escopo, o assessor parlamentar do Diap Neuriberg Dias identificou mais de 50 matérias em tramitação na Câmara e no Senado, que demonstram que os empresários e sua bancada legislativa aguardam apenas um ambiente mais favorável para avançar sobre os direitos dos assalariados.

As propostas versam sobre terceirização total das relações de trabalho (PLC 30/15), passando pelo impedimento de o empregado demitido reclamar na Justiça do Trabalho (PL 948/11 e PL 7.549/14), até a prevalência do negociado sobre o legislado (PL 4.193/12).

No Senado, tramita a regulamentação e retirada do direito de greve dos servidores (PLS 710/11 e PLS 327/14), a privatização das empresas públicas (PLS 555/15), e, ainda, a proibição de indicar dirigente sindical para conselheiro dos fundos de pensão públicos (PLS 388/15).

Clareza de objetivos

A massa que tem ido às ruas, sob a influência da pauta difundida e defendida pela mídia, não tem noção do papel que desempenha nesse processo de negação da política. Cega de ódio, a chamada ‘classe média’ não consegue ou não quer enxergar que o País melhorou e o povo mais pobre, a imensa maioria, se empoderou, melhorou de vida. Ampliou direitos, renda, educação e tantos outros benefícios negados ao longo de décadas.

A crise econômica prejudica, sobretudo, o setor mais pobre da sociedade, que ao não ser superada, perderá o que conquistou em razão do travamento da economia por falta de investimentos do governo e do setor produtivo.

Mas o mercado sabe, pois foi o principal beneficiário dessa melhoria. Entretanto, sob o comando dos banqueiros, dos donos da mídia, e dos empresários representados pela Fiesp-CNI, nunca se viu ou quis ser representado por um presidente e agora uma presidente que não são do seu meio ou defendam mais diretamente os seus interesses. Muito embora, a bem da verdade, esses interesses nunca terem sido ameaçados. Pelo contrário, foram preservados e protegidos.

Ao fim e ao cabo, os que detêm e manipulam os cordéis estão pouco se lixando para a corrupção. A narrativa é apenas e tão somente para mobilizar os estratos que lhes apoiam e sustentam política e eleitoralmente.

Referências históricas

A tão festejada operação ‘Mãos Limpas’, na Itália, na década de 90, embora legítima, redundou em 20 anos de retrocessos e populismo conservador com Berlusconi.

No Brasil, para que não pairem dúvidas quanto aos interesses inconfessos do mercado, basta voltar meio século, pós 1º de abril de 1964. Não se trata de comparação, pois os tempos são outros. Entretanto, é possível e plausível traçar um paralelo entre aquele tempo e este, cujos atores são os mesmos, com exceção dos militares, que hoje não têm protagonismo político.

Esses são invocados por aqueles por puro desconhecimento histórico e ignorância política, pois a corrupção no Brasil teve mais acolhida e proteção exatamente no período do regime militar, cuja imprensa não era livre e as liberdades democráticas não existiam.

Não é coincidência, que uma das demandas dos manifestantes, que a cobertura da mídia tem vergonha e pudores de mostrar, é a tal da ‘intervenção militar constitucional’.

Uma das primeiras providências da ditadura militar, que durou 21 anos, no plano econômico, foi impor aos trabalhadores um pesado arrocho salarial, com invariáveis reajustes abaixo da inflação. No plano político, as entidades sindicais foram inviabilizadas, houve centenas de cassações, prisões, desaparecimentos, exílios e mortes de dirigentes sindicais, entre outros que se opunham ao regime de exceção.  

 

 

 



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