Talvez porque as características mais
marcantes dos brasileiros sejam o bom humor e a simpatia, existe
uma enorme dificuldade em se admitir o racismo da nossa sociedade.
Afinal, racismo é uma crueldade inaceitável e ninguém quer ser
identificado com tal perversão.
A realidade, no entanto, mostra que o
racismo é estrutural em nosso País. Uma herança de vários séculos.
E exatamente por isso estimula comportamentos, atitudes e
pensamentos de grande parte da sociedade e garante
privilégios, maiores ou menores, a determinados grupos, mesmo entre
as classes subalternas.
Ignorar,
não debater nem buscar soluções para o problema que o Brasil tem em
relação à questão racial e a escravidão, só prolonga o sofrimento
das vítimas de racismo, que convivem com o preconceito, a falta de
oportunidades no mercado de trabalho e salários mais baixos, entre
tantos outros problemas.
Acusar as
pessoas realmente preocupadas com o combate às desigualdades
raciais de racismo, é projetar seu próprio preconceito no outro
para fugir covardemente do debate sério e construtivo. Vimos muito
essa inversão de valores nos debates sobre as cotas. Por que uma
ação afirmativa como essa ainda provoca tanta discussão contrária?
Por que é tão difícil entender que cotas para negros é o resgate de
uma dívida histórica com essa parcela da sociedade e não um mero
problema socioeconômico.
Para nós, a
cor da pele não pode, de maneira alguma, determinar o lugar
de um/a cidadão/a na sociedade. É preciso dar voz e espaço aos
negros e às negras e, principalmente, garantir escolaridade,
trabalho e renda; e, assim, eliminar de uma vez por todas o
preconceito racial da nossa sociedade.
A CUT e a
III CONAPIR
No ano em
que comemora três décadas de existência, a CUT se engajou na
preparação da III Conferência Nacional de Promoção da Igualdade
Racial (CONAPIR), que será realizada em Brasília, entre os dias 5 a
7 de novembro.
Essa
Conferência tem como objetivo sistematizar, a partir de consultas,
conceitos estratégicos a construção de uma agenda positiva para as
políticas de igualdade racial no próximo período. Ela propõe quatro
eixos de discussão: 1) estratégias para o desenvolvimento e o
enfrentamento ao racismo; 2) políticas de igualdade racial no
Brasil; 3) arranjos institucionais para assegurar a
sustentabilidade das políticas de igualdade racial; e, 4)
participação política e controle social.
A CUT
sistematizou um documento que trata do acúmulo que tem desenvolvido
ao longo de sua história sobre o combate a discriminação racial no
Brasil. Nesse documento, apresentamos 3 temas que acreditamos serem
fundamentais para o desenvolvimento econômico do País sem racismo:
saúde, educação e trabalho.
Avanços
Não podemos
negar que progredimos nos últimos 10 anos. Os avanços nas políticas
voltadas a promoção da igualdade racial, por exemplo, demonstram o
impacto positivo das ações afirmativas na autoimagem e na
perspectiva de vida dos afrodescendentes, principalmente, os jovens
que têm oportunidades que seus pais não
tiveram.
Indicadores
socioeconômicos apontam melhoria nas condições de vida da população
negra, bem como no acesso a serviços e direitos. Aspectos como
renda, expectativa de vida e acesso à educação melhoraram, mas
ainda não se assemelham aos dos brancos. A ascensão da classe C no
Brasil permitiu um acesso maior de parte significativa da população
negra brasileira a renda e ao consumo.
Embora
persistam os debates sobre ações afirmativas, é inegável que as
cotas para o ingresso nas universidades e no serviço público
permitiram a entrada de negros e de negras em espaços que antes
eram privilégio dos brancos. Mas, essas ações de resistência contra
o racismo e de ascensão social de negros precisam ser
consolidadas.
Não
poderíamos deixar de citar conquistas como a criação da SEPPIR -
Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (criada
pela Medida Provisória n° 111, convertida na Lei 10.678) e da Lei
10639/2003, que estabelece o ensino da História da África e
da Cultura afro-brasileira nos sistemas de ensino. Ambas completam
dez anos esse ano.
A SEPPIR
foi criada a partir do reconhecimento das lutas históricas do
Movimento Negro brasileiro e do ponto de vista da
institucionalização da política de promoção da igualdade racial,
desencadeou no Brasil a possibilidade de criação de órgãos
estaduais e municipais que são extremamente importantes para fazer
chegar até as pessoas tudo que é pensado para incluir a população
negra.
Já a Lei
10639 é uma das primeiras baseadas em ações afirmativas para que
todos conheçam mais sobre os negros, pois além da escravidão, as
pessoas precisam conhecer as lutas, culturas negro-brasileiras e
contribuições dos/as negros/as para a formação da sociedade – nas
áreas da política, da economia, da cultura, entre
outros.
A aprovação
da PEC das Domésticas, que ficou popularmente conhecida como a
“Nova lei Áurea” foi mais um sopro de liberdade por reconhecer
direitos para os mais de 2 milhões de trabalhadores e trabalhadoras
domésticas, em sua maioria negros. Esses trabalhadores que
enfrentam baixos salários, longas jornadas de trabalho, escassa ou
nenhuma proteção social, más condições de vida e um descumprimento
generalizado das normas laborais. Agora falta, por parte do
governo, a ratificação da Convenção 189, que reconhece esses
direitos.
Desafios
Todos os
dados estatísticos mostram que estamos muito longe de uma equidade
racial. Estamos falando taxas de analfabetismo, salários mais
baixos, desemprego ou subemprego.
Recente
pesquisa realizada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada –
IPEA, aponta que, no Brasil, a probabilidade do negro ser vítima de
homicídio é oito pontos percentuais maior, mesmo quando se compara
indivíduos de outros grupos com escolaridade e características
socioeconômicas semelhantes. Isso significa que só o fato de nascer
negro já coloca a pessoa em um grupo de risco de morte
violenta.
As
desigualdades sociais continuam enormes. Segundo dados da PNAD,
quando observamos a evolução contingente de pobres por raça/cor e
gênero, temos a comprovação do viés. Entre 2002 e 2012, a
participação da população branca entre os pobres caiu 19,6%
enquanto que a participação da população negra subiu 8,2%. Quando
fazemos o corte por gênero e raça/cor, observamos que a maior
redução se deu no caso dos homens brancos, cuja participação caiu
22,4%, seguido das mulheres brancas cuja participação entre os
pobres caiu 17%. Já para o caso da população negra, o maior aumento
incidiu sobre a mulher negra, cuja participação entre os pobres
cresceu 10,6%, enquanto que no caso dos homens negros esse
percentual subiu 5,9%.
Por tudo
isso, a Secretaria Nacional de Combate ao Racismo da CUT continuará
lutando para combater toda e qualquer forma de discriminação,
preconceito e desigualdade, debatendo e implantando ações com o
objetivo de que todos os trabalhadores e trabalhadoras possam ser
tratados sem discriminação.
Um país
rico é país sem pobreza e sem racismo!
Escrito por Julia Nogueira, Secretária
Nacional de Combate ao Racismo e
Vagner Freitas ,Presidente Nacional da
CUT.
Secretário Nacional de Comunicação da CNTTL: José Carlos da Fonseca - Gibran
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