"Os negros estão vindo ao serviço público, porque são preparados"

Confira no Portal CNTT o artigo do secretário do Núcleo Petista de Administração Pública.


Publicação: 11/11/2013
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A presidenta Dilma Rousseff assinou, na abertura da III Conferência Nacional de Promoção da Igualdade Racial, 5 de novembro, em Brasília, projeto-de-lei que estabelece cotas raciais, num percentual de 20%, para os concursos públicos, medida essencial para consagrar os caminhos para a superação das bases sobre as quais se ergueu o Estado brasileiro: a escravidão, o tráfico negreiro e todos seus desdobramentos ideológicos, que produziram o racismo nacional travestido da retórica meritocrática. Sim, porque com mais renda e oportunidades, é fácil à elite branca efetivar seus direitos e dizer-se mais preparada.
Se o estudioso Mário Theodoro, à época da conquista das cotas no ensino superior, já alertava que a universidade pública é considerada excelente e esse era o “filé” que as elites brancas não quereriam dividir, espera-se agora uma reação ainda mais virulenta por parte dos ideólogos do padrão de dominação vigente no país.
E isso não tardou.
Apenas um dia após o anúncio, festejado em uma imensa Kizomba no plenário da III Conapir, em editorial de 7 de novembro, a Folha de São Paulo, prenhe do pseudo-constitucionalismo de 32, já desanca a medida: “Quando o Estado contrata um servidor, espera-se que seja o mais qualificado”, diz ele. Demétrio Magnoli, escriba tradicional do elitismo neoliberal, atacou em artigo: “O racialismo exibe-se, agora, como ele realmente é: um programa de divisão dos brasileiros segundo o critério envenenado da raça”.
Pelo menos, parecem esgotar-se os argumentos, já que repetem as mesmas artificialidades expelidas quando o ex-presidente Lula anunciou o que considero a parte mais importante da reforma universitária construída gradualmente pelo seu governo: a invasão da universidade pelo povo e sua hiper-coloração. Já bastava de um ensino superior financiado pelos pobres, em sua maioria negra, por causa de nossa carga tributária regressiva, e a incongruente produção de diplomas quase que exclusivamente para as rendas mais altas da sociedade.
Já é lugar comum a constatação, via inúmeras pesquisas e estudos, de que os cotistas obtiveram desempenho melhor do que os que ingressaram pela meritocracia tradicional, logo a reserva de vagas apenas desmontou o que todos sabíamos: que a rede particular é mais bem estruturada que a pública, por causa da reforma educacional da ditadura e dos anos de neoliberalismo (1990-2002).
Hoje, podemos, felizmente, saudar uma geração inteira de negros com ensino superior, lutando para se pós-graduar nos máximos níveis possíveis, sob os auspícios do ProUni e das cotas, o que também serviu enormemente para a mobilidade social das famílias afrodescendentes do país, num cenário de grande geração de emprego e desenvolvimento. Não à toa, são os negros a maioria da população em mobilidade social no Brasil, embora os números mais recentes da PNAD ainda revelem uma desproporção entre os rendimentos de negros e brancos. Aqui, mais uma prova do acerto da opção por não deixar gerações e gerações esperando pelo incremento da rede pública – que vem ocorrendo à olhos vistos devidamente reconhecido pelas agências internacionais – pois isso significaria mais décadas de exclusão social.
O desafio das cotas no serviço público, portanto, vem fechar duas contas principais: aproveitar esta nova geração de universitários negros e completar uma nuance da lógica que embasou a decisão de democratizar o acesso à universidade, que é potencializar a mobilidade social. Giovanni Harvey, secretário-executivo da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR), não se poupa de demonstrar intra e extra-governo o quanto o funcionário público negro, mesmo que em funções menores nos anos 30, 40, 50, foi essencial para produzir uma exígua classe média negra, porém fundamental para que alguns de seus filhos pudessem estudar, se formar e melhorar a vida da família, em sentido amplo, como um todo.
Além disso, a República precisa e deve fazer o bom uso desta nova inteligência, “know how” e “savoir faire” desta geração, que é fruto de um grande investimento público e não pode ficar apenas disponível para o mercado, que é sim um dos objetivos inconfessáveis dos argumentos anti-cotas. O Estado precisa deste capital humano e sua tecnologia para incrementar ainda mais e melhores serviços públicos, num contexto de expansão de políticas públicas e, portanto, de seu planejamento e gestão, até mesmo para que haja um efeito semelhante ao que deve ocorrer em âmbito acadêmico: um novo olhar a partir do ser social negro e oriundo das camadas de baixa renda. Lá, influenciando os rumos da pesquisa, do ensino e da extensão. Aqui, os rumos dos instrumentos de elaboração, monitoramento, avaliação e execução da política pública.
Claro que isso demanda também organização política porque a virada do “etnia em si” para “etnia para si” não é um processo automático, mas isso é uma outra história.
Por fim, a implementação das cotas raciais no serviço público chegará no momento certo em que o Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão constrói um projeto-piloto de convergência entre as conferências nacionais e o Plano Plurianual (PPA), isto é, criar a conexão direta entre os produtos das primeiras com o próximo ciclo do segundo. A III Conapir já é a primeira experiência neste sentido. Novamente citando livremente Giovanni Harvey, a partir de entrevistas e discursos recentes dele, esta conferência não objetiva mais construir planos para promoção da igualdade racial, mas incidir diretamente no PPA, ou seja, no instrumento constitucional de planejamento governamental no âmbito da União.
Assim, teremos ainda mais os negros (e demais etnias historicamente sonegadas de seus direitos) inscritos e qualificando o desenvolvimento do Brasil. E um serviço público ainda mais forte, coma presença de inteligência negra para seu planejamento e gestão será imprescindível.
Os negros estão vindo ao serviço público, sim, porque estão muito preparados.

Leopoldo Vieira (Foto: PT) é assessor especial da Secretária de Planejamento e Investimentos Estratégicos do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, coordenador do Monitoramento Participativo do PPA e secretário do Núcleo Petista “Celso Daniel” de Administração Pública.



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