O Portal da
CNTT-CUT divulga a seguir a entrevista com o economista Luiz
Gonzaga Belluzzo, publicada na quarta-feira, dia 17, pela agência
Carta Maior. Na entrevista, Belluzzo avalia que a presidente Dilma
Rousseff tem uma visão clara do que deseja para o país a longo
prazo, mas terá de enfrentar fortes obstáculos para concretizar um
projeto de futuro. Um deles é a dificuldade dos agentes econômicos
de privilegiar as decisões conjunturais às de caráter
macroeconômico.
Confira a seguir:
Espaços de mediação
Para Belluzzo, a democracia não pode se resumir exclusivamente ao
voto. Os espaços de controvérsia e discussão fazem parte do
processo democrático. “A cidadania é o exercício permanente de
participação”, afirma. No Brasil, todavia, instâncias
intermediárias, destinadas a aproximar o escolhido pelo voto e o
cidadão, não são levadas muito em conta. “Essas práticas foram
construídas pelos governos do PT e num período ainda mais recente
nos descuramos um pouquinho da importância dessas práticas”,
afirmou o economista. Exemplos positivos dessas práticas são o
Orçamento Participativo e os conselhos.
“Os conselhos têm representação do todo, portanto são fundamentais
para a construção da vida democrática”, diz Belluzzo. E são
particularmente importantes num Estado que ganha complexidade, e
onde a burocracia tende a se autonomizar.
Para que o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES)
funcione, o fundamental é a “diversidade de pontos de vista e de
formação”, opina.
Papel de coordenação do Estado
“A tentativa de separar o Estado e o mercado é uma dicotomia
falsa”, afirma Belluzzo. “Como dizia Fernand Braudel, não há
capitalismo sem Estado.” E a agenda do Estado, segundo ele, tem de
ser a de coordenar um mercado que não tem tendência a gerar bons
resultados do ponto de vista da equidade; não tem tendência à
estabilidade; nem permite projetar uma economia de longo prazo. O
Estado deve restabelecer suas três funções: de “corretor de
desigualdades”; de “evitar o excesso de instabilidade econômica”; e
de planejar a longo prazo.
Reformas estruturantes
Desde o governo Lula, Belluzzo, Delfim Netto e o ministro Guido
Mantega se reúnem regularmente para debater a economia – antes com
Lula, agora com a presidente Dilma Rousseff. Desde então, as
preocupações se concentram em três questões, segundo Belluzzo: “a
relação perversa que o Brasil tinha entre a taxa de juros e o
câmbio, com câmbio muito valorizado e taxas de juros muito altas”;
em decorrência, a saída da “estrutura de fornecimento” do país (o
fornecimento interno passa a ser feito pelo exterior), que tem um
efeito inflacionário potencialmente grave, se ocorre a
desvalorização cambial; e uma infraestrutura atrasada que onera
muito fortemente a exportação do país.
Para Belluzzo, o Brasil se comportou “razoavelmente bem” no
pós-crise de 2008 – “aliás, acho que muito bem”, retifica – e a
presidente Dilma tem feito um grande esforço para quebrar essa
“relação perversa” entre juros e câmbio, que é um “convite para que
as empresas tomem empréstimos em moeda estrangeira”. “Nós já
assistimos esse filme várias vezes, provavelmente desta vez não
vamos sofrer tanto, porque temos US$ 375 bilhões de reservas”,
ressalva. De qualquer forma, é uma equação que traz um alto grau de
instabilidade.
A infraestrutura brasileira estagnou na década de 70, na crise da
dívida externa brasileira, e hoje exibe enormes gargalos. É um
enorme ônus para as exportações brasileiras, afirma o
economista.
A presidente Dilma “tem clara a questão de longo prazo”, diz
Belluzzo, mas enfrenta uma série de dificuldades, inclusive a de
governar em um momento em que a conjuntura “tapeia”, ou seja,
obscurece, a questão mais importante, que é macroeconômica. Um dos
enganos colocados pela conjuntura, exemplificados por Belluzzo, é a
falsa ideia de que a economia brasileira vai se tornar uma economia
de serviços. “Esta é uma fuga da realidade”, afirma. “Os americanos
e os europeus, neste momento, estão desesperados para se
reindustrializar”.
“Durante 30 anos marcamos passo na questão da industrialização”,
afirmou. Nessas décadas, a indústria mundial mudou completamente e
hoje está concentrada na Ásia e na China. As cadeias produtivas
foram internacionalizadas. “E o Brasil ficou à margem do processo
de internacionalização produtiva”, afirma.
Para Belluzzo, a reintegração produtiva do país recoloca, neste
momento, a questão do protecionismo. Dilma defende, por exemplo,
que a exploração do petróleo na camada de Pré-Sal seja condicionada
a uma forte demanda de conteúdo nacional. “Aí os conservadores
dizem: não, isso é coisa atrasada. Não é atrasada: eles que são
atrasados, pois na verdade, para manter e desenvolver e até atrair
o capital estrangeiro (...) você precisa desse tipo de política”,
afirma. E o fato é que, desde os anos 70, o Brasil vive um declínio
sistemático da indústria.
A questão a ser resolvida num processo de desenvolvimento, para
Belluzzo, é a educação – não necessariamente a educação técnica,
mas fundamentalmente a educação cidadã. “É preciso a formação de
cidadãos, para que não se forme o especialista idiotizado”, diz.
“Você não pode ter um país desenvolvido sem ter um cidadão capaz de
compreender”.
“O meu maior medo”, diz Belluzzo, “é que o Brasil vire um país
rico, próspero, mas com uma população insuficientemente formada e
com baixo nível cultural”. Isto, segundo ele, não é defender uma
ilustração das pessoas, mas “a capacidade de compreensão e de
julgamento”.
Estado de Bem-Estar foi derrotado
“O neoliberalismo não é um produto de [Ronald] Reagan ou
[Margareth] Thatcher, é produto da derrota da luta social. Foi essa
derrota que permitiu a ascensão de Reagan e de Thatcher”, afirma o
professor. Ele afirma que, em no final dos anos 60, meados dos anos
70, “começou a haver um certo incômodo (...) com o poder dos
sindicatos, com a interferência do Estado, ou seja, as classes
dominantes e dirigentes começaram a se sentir incomodados dentro do
espartilho que o Estado lhes colocava, com o poder do sindicato de
reivindicar etc.”
A primeira coisa que Reagan e Thatcher fizeram, o pontapé inicial
para a retomada do liberalismo, foi derrotar os sindicatos. “Esse
foi o fator fundamental e aí começaram as liberações, começaram a
flexibilizar o mercado de trabalho, fizeram a liberação financeira
etc.”
Pior que 1929
A crise de 2008 repôs um problema tratado há 70 anos: a coordenação
do sistema monetário internacional. Descortinou um sistema onde a
coordenação torna-se impossível, na medida em que os Estados
Unidos, país gestor da moeda de reserva, não assume
responsabilidades globais e os países que não têm moeda conversível
pagam pelo choque de qualquer mudança na política econômica
norte-americana.
“Não é possível que os Estados Unidos, que são os gestores da moeda
de reserva e, portanto, têm responsabilidades globais, tomem
decisões em função de seus interesses que desorganizam a economia
de todo o mundo”, diz Belluzzo. “Você não faz nada de errado, mas
você leva o choque de qualquer mudança na política americana”.
Para o economista, a crise atual remete à mesma discussão sobre o
sistema monetário que se repete há 70 anos, sem que nada importante
tenha efetivamente acontecido. Como as instituições multilaterais
não cumprem o papel regulador, “cada um toma a atitude que acha
conveniente”. “Não aconteceu nada em relação aos desequilíbrios
internacionais, nem à questão da regulamentação ou do controle do
sistema financeiro”, conclui.
A grande crise do Século XXI também traz como desvantagem o fato de
não ter produzido nada de novo, ao contrário da crise de 1929, que
resultou em reformas importantes. “Os governos [apenas] protegeram
seus sistemas bancários, impediram o que seria catastrófico, uma
brutal desvalorização (...), mas não fizeram mais nada. Deixaram
tudo como está.”
Uma religião chamada economia
“A economia é uma forma de conhecimento que, hoje em dia, se
aproxima muito da religião, porque transformou certas coisas em
dogmas”, afirma Belluzzo. E esses dogmas dominam as cabeças da
maioria dos economistas formados nas melhores escolas americanas e
europeias. O domínio ideológico da escola econômica neoliberal tem
o poder de impedir grandes mudanças, segundo o professor. “Hoje se
pode fazer pouca coisa para avançar, mas não se pode vencer o que
está encastelado nas finanças e nas universidades que servem às
finanças”, diz Belluzzo.
Essa predominância constitui um verdadeiro “bloqueio ideológico”
que, somado a debilidades do Estado atual de fazer mudanças,
produzem uma grande dificuldade de governos de fazer política.
“Você não tem mais um Estado capaz de fazer política”, diz
Belluzzo. “O Estado americano, por exemplo, não passa de um comitê
de empresas”, afirma. A exceção fica por conta do Estado chinês:
“Ali se pode ganhar dinheiro à vontade, só que nas políticas de
longo prazo do governo chinês ninguém mexe”.
Com
informações da Carta Maior- Maria Inês
Nassif
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