O Portal CNTT/CUT divulga artigo de Márcio
Pochmann, presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
(Ipea), professor licenciado do Instituto de Economia e do Centro
de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho (Cesit) da
Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). No texto, ele explica
sobre o cenário do mercado econômico brasileiro e o
desenvolvimento. Leia a seguir:
Durante meio século, entre as
décadas de 1930 e 1970, o Brasil transformou-se substancialmente de
uma sociedade agrária e assentada na produção primária exportadora
para uma nova condição social urbana e industrial. Não obstante os
avanços em sua base material, sua estrutura produtiva manteve-se
fortemente heterogênea, com a convivência de uma multiplicidade de
níveis de produtividade do trabalho. A prevalência de uma estrutura
produtiva heterogênea estimulou o funcionamento extremamente
segmentado do mercado de trabalho por decorrência de padrões
tecnológicos compatíveis com o uso e a remuneração demasiadamente
assimétricos da mão de obra. Em geral, isso significou que parcela
significativa da força de trabalho se mantivesse ocupada no
exercício de atividade de baixa produtividade, muitas vezes ao
nível da subsistência apenas. Assim, o desemprego aberto permanecia
quase inexistente, concedendo a falsa impressão do pleno emprego
conforme verificado na Europa do segundo pós-guerra.
Por outro lado,
constatou-se o aumento na ocupação da mão de obra em atividades de
média e alta produtividade do trabalho. Enquanto uma parcela dos
trabalhadores foi sendo alocada em setores modernos da economia,
restou ainda parte majoritária prisioneira, muitas vezes, ao
exercício de atividades associadas à subsistência. Ainda que
desiguais, os diversos setores de atividades ocupacionais
mantiveram-se, em geral, dinâmicos na convivência entre as funções
modernas e arcaicas.
Com a crise da dívida externa, no
início dos anos 1980, o conjunto das forças políticas
compromissadas com o projeto urbano industrial desde a década de
1930 passou por importante processo de decomposição. Em função
disso, o Brasil percorreu, a partir daí, duas distintas trajetórias
nas estruturas de produção e trabalho. Do final dos anos 1980 ao
início da década de 2000, a trajetória neoliberal ganhou
envergadura política suficiente para impor um significativo
programa de reformas no papel do Estado e liberação generalizada no
comércio, produção, mercado de trabalho e nas finanças. O resultado
em termos de desempenho econômico foi pífio, uma vez que o
predomínio do baixo crescimento da produção impôs enorme retrocesso
na posição econômica mundial, com a retração da oitava para a 13ª
posição global.
Na questão social não foi
diferente. Houve enorme agravamento do desemprego que se fez
acompanhado da queda na participação dos salários na renda
nacional.
Em
grande medida, assistiu-se ao aprofundamento no grau de
subdesenvolvimento nacional, com a maior concentração da
participação no Produto Interno Bruto (PIB) de setores de maior
produtividade e decrescente absorção de mão de obra. Em 1998, por
exemplo, os setores de alta produtividade responderam por 57% do
PIB, enquanto em 1985 representavam 49,7% (elevação de 14,7%). Na
contrapartida, esses mesmos setores de alta produtividade do
trabalho reduziram a participação relativa na ocupação total de mão
de obra de 16,1%, em 1985, para 13,9%, em 1998 (redução de
13,7%).
No
outro extremo, os setores econômicos de baixa produtividade
reduziram a participação no PIB, ao mesmo tempo em que elevaram o
grau de absorção da mão de obra. Entre 1985 e 1998, o peso relativo
no PIB dos setores de baixa produtividade caiu 24,6%, enquanto a
participação na ocupação total aumentou 6,8%. Resumidamente, os
segmentos de baixa produtividade terminaram servindo de
amortecimento ao avanço do significativo desemprego aberto dos
trabalhadores, por meio da expansão das atividades laborais
associadas à subsistência. A ampliação das atividades de
subsistência para grande parte da força de trabalho indicou a
trajetória do aprofundamento do subdesenvolvimento
brasileiro.
Nova Trajetória
Na
década de 2000, contudo, o país perseguiu outra trajetória
econômica voltada à reconfiguração de parte de sua estrutura
produtiva. Com o ritmo de crescimento da economia duas vezes
superior ao do período anterior, as políticas públicas de caráter
pós-neoliberal impactaram diretamente a estrutura produtiva e o
funcionamento do mercado de trabalho. Assim, observa-se que entre
1998 e 2009 os setores de alta produtividade tanto reduziram o peso
relativo na composição do PIB (10,2%) como ampliaram a participação
relativa no total da ocupação de trabalhadores (25,9%). O rumo do
desenvolvimento, nesses termos, reforça-se pela difusão contínua do
progresso técnico de maneira menos desigual possível entre o
conjunto dos setores da economia.
Na primeira década de 2000, os
segmentos de baixa produtividade aumentaram a participação no PIB
(44,2%), ao mesmo tempo em que reduziram a absorção de
trabalhadores (13,6%) no ambiente geral de queda do desemprego
aberto. Com a redução do segmento laboral vinculado às atividades
de subsistência, o segmento econômico de baixa produtividade elevou
seu peso no PIB possivelmente a partir da redução na diferença de
produtividade em relação aos outros setores de alta e média
produção por ocupado. Os setores de atividade econômica com média
produtividade aumentaram suas posições tanto no PIB como na
ocupação. Ou seja, um movimento inverso ao observado entre os anos
de 1985 e 1998.
Mesmo assim, o Brasil segue com
parcela substancial de sua mão de obra ainda prisioneira de
atividades meramente de subsistência. Somente o avanço das
políticas de convergência produtiva que promovam a continuidade da
inclusão social mostra-se capaz de promover a ruptura com o curso
do processo de subdesenvolvimento nacional.
Secretário Nacional de Comunicação da CNTTL: José Carlos da Fonseca - Gibran
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